Reflexão sobre a obra: "Cultural Digital Printing" de Mariagrazia Quaranta
No verão de 2021, passei algumas semanas na minha casa de férias, na Lourinhã, que é relativamente perto de Caldas da Rainha. A minha mãe achou que seria uma ótima ideia irmos ao Museu das Caldas da Rainha e visitarmos a exposição de Cartoon que estaria exposta naquela altura.
Nunca pensei que, passado cerca de 5 meses, estaria a escrever sobre uma das obras expostas. É verdade, este Cartoon que se chama "Cultural Digital Printing" ganhou o primeiro prémio da 16º edição do concurso World Press Cartoon e estava exposto numa das paredes daquele museu no dia que eu o visitei.
Numa primeira observação rápida sobre a obra achei que, um cartoon tão simples e tão insignificante, era impossível ter ganho o primeiro prémio. Porém, quando olhei com maior atenção, reparei que era uma impressão digital e que a mesma era feita de livros, revistas e jornais. Achei curioso.
Afinal, porque razão haveria uma impressão digital, algo pessoal e único de cada indivíduo, estar representado através de livros?...
Numa aula de Psicologia, algo me despertou para o quadro. Estaríamos a falar de cultura, de diversidade cultural e da sua importância. Lembrei-me logo do cartoon. Quando cheguei a casa, liguei o computador e procurei a imagem desse cartoon.
Assim que a encontrei no google, fiquei a olhar para ela durante um bom tempo, até que cismei: "Olha... que algo interessante para adicionar ao e-portefólio. Pus "mãos à obra".
Afinal, o que teria este cartoon de tão importante e porque razão a aula de Psicologia me teria despertado para o mesmo?
Dito por Edward B. Taylor a cultura é: "a totalidade dos conhecimentos, das crenças, das artes, dos valores, leis, costumes e de todas as outras capacidades e hábitos adquiridos pelo Homem enquanto membro da sociedade"
A cultura funciona como mecanismo adaptativo e cumulativo que, a todos os instantes, sofre mudanças. A cultura e os costumes são algo que fazem parte de cada um de nós, parte daquilo que somos e representamos. Cada um de nós cresceu num determinado ambiente e este contribuiu para aquilo que hoje somos. A cultura é um elemento imprescindível no ambiente de cada pessoa, influencia o modo como as pessoas pensam, sentem e se comportam. Para além da forma de ser de cada um, está também relacionada com o que vivemos e as nossas experiências.
Uma vez que a cultura é dinâmica, traços se perdem, outros se desenvolvem, em velocidades distintas nas diferentes sociedades. Para haver uma introdução de novos traços e características, a invenção ou introdução de novos conceitos, e a difusão de conceitos a partir de outras culturas precisa de acontecer. Os aspetos culturais estão ligados entre si e, a uma mínima alteração de apenas um deles pode implicar alterações em todos os outros.
A cultura tem um papel muito importante na vida de cada um de nós, uma vez que influencia as pessoas que entram em contato com ela. Esta influência não é apenas relevante a nível comportamental, mas também porque condiciona a nossa maneira de pensar e de sentir.
A teoria de Michael Sandel afirma que somos todos seres comunitários. Somos "eus" situados socialmente e enraizados, pertencendo a uma família que nos impõe/transmite valores e normas morais. "A crítica de Sandel ao liberalismo mostra-nos que nossa identidade (social, cultural, étnica) é determinada por fins descobertos e desvelados pela nossa inserção num determinado contexto social"
Somos livres mas, ao mesmo tempo, somos condicionados pelos valores e normas morais da comunidade em que crescemos. Estas normas e valores são-nos impostos, e sobre isto, nós não temos liberdade.
Aquilo que aprendemos: as maneiras de agir, os valores, as ambições e as crenças fazem parte de nós e são a nossa estrutura moral. O facto desta impressão digital ser feita de livros remete-me para uma igualdade entre todos apesar de sermos todos diferentes, tanto fisicamente, geneticamente e, principalmente, culturalmente.
Ao mesmo tempo, esta diferença cultural é o que nos liga uns aos outros e é o que nos torna únicos, especiais e diferentes uns dos outros.
Os elementos simbólicos, como as crenças, materializam-se nas múltiplas produções culturais: numa peça de vestuário, nos instrumentos utilizados, no modo de coser, na expectativa de quem cose ser, provavelmente, uma mulher.
Não é apenas o que somos, nem do que o nossos processos psicológicos resultam mas sim da influência modeladora da cultura. Para além de produtos da cultura, somos também os seus maiores produtores. A forma como pensamos e nos comportamos, as escolhas/opções que tomamos fazem parte da cultura em que estamos integrados, da sua construção, transmissão e transformação.
Esta influência inicia-se muito cedo. Desde o primeiro segundo do nascimento, o bebé começa a sentir o impacto da cultura: na maneira como vem ao mundo; na maneira como o cordão umbilical é cortado; na forma como é lavado e segurado pela mãe e na maneira de como é vestido"
Eu como pessoa, quando nasço sou obrigado involuntariamente a abraçar a cultura do meio em que nasço pois não possuo qualquer tipo de consciência nem poder de decisão. Quando nascemos não escolhemos o meio em que nos inserimos, o que influencia a nossa existência.
Ao mesmo tempo que a cultura é algo bastante importante nas nossas vidas é também a nossa maior inimiga. É devido à mesma que são feitas projeções da nossa pessoa, é esperado que, eu, acabe o secundário, entre para a faculdade, comece a ganhar um salário, construa uma família, tenha filhos e etc... Tudo aspetos que foram programados para serem assim devido à cultura.
Em suma, a cultura é mais do que a soma de crenças, artes, valores, leis, costumes, etc... A cultura é uma totalidade onde se conjugam todos estes diversos elementos materiais e simbólicos.
Como dizia André Malraux: "A cultura é o que na morte continua vivo".